Extensão Universitária

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Embora muitas vezes idealizada como instituição responsável por formar uma massa crítica, produzir novos conhecimentos e, de certa forma, transformar o meio social, a Universidade cumpre um papel claro na ordem e no funcionamento da sociedade capitalista. Os muros, visíveis e invisíveis, que hoje cercam essa instituição, a transvestem com uma falsa neutralidade, pois não fazem dela uma instituição dissociada dos interesses que permeiam a sociedade. Pelo contrário, dentro da universidade há a reprodução e a sofisticação dos mecanismos opressores existentes fora dela, servientes aos interesses da classe dominante.

Os conhecimentos e tecnologias que a universidade produz ora não interessam diretamente aos setores explorados da população, ora são transformados em mercadorias: a mesma sociedade que possui estrondosos avanços tecnológico-científicos na produção de alimentos tem mais da metade da sua população passando fome; na sociedade com incrível desenvolvimento farmacêutico, ainda se morre por doenças curáveis já extintas nos países centrais. A universidade, ainda, tem função de formar e distribuir profissionais técnicos que se adaptem às demandas do mercado de trabalho e ocupem postos específicos dentro da cadeia de produção. O acesso à universidade também demonstra como esta é um instrumento da ordem capitalista: não há lugar para todos na academia e, portanto, esta acaba por assumir a função de hierarquização da força de trabalho. A seleção e classificação é feita segundo a lógica da meritocracia, conceito essencial nas sociedades capitalistas cujo fim é vender a ideia de que todos têm as mesmas condições de ascensão social, dependendo apenas do esforço individual, desconsiderando todas as contradições sociais que esta sociedade produz. Ora, assim como precisamos de médicos, advogados, engenheiros, professores, também precisamos de pedreiros, empregadas domésticas, garis, e, então, a universidade servirá como instrumento de “seleção” daqueles que serão mais ou menos explorado. Como resultado, àqueles que, “por mérito”, nasceram em famílias privilegiadas socialmente que conseguiram oferecer um estudo primário e secundário de qualidade serão oferecidos postos privilegiados na escala de produção, reforçando a rígida estrutura social em que vivemos.

“A universidade é simplesmente uma instituição dominante ligada à dominação. Não é uma instituição neutra; é uma instituição de classe, onde as contradições de classe aparecem” [Maurício Tragtenberg]

A extensão universitária vai na contramão dessa lógica, uma vez que busca quebrar esses muros existentes na universidade. Os primórdios da extensão universitária aparecem na Europa, no século XX, com as chamadas “universidades populares” cujo objetivo era disseminar os conhecimentos técnicos à população. Nas experiências americanas, por sua vez, havia o objetivo de “ilustrar” as comunidades, e ainda predominava a ideia de prestação de serviços.

Mas é na América Latina que a extensão universitária nasce para os movimentos sociais. Na Argentina, em 1918, no contexto de acontecimentos como Revolução Mexicana e Revolução Russa, acontece o Movimento de Córdoba, no qual uma revolta estudantil exigia da universidade um olhar mais atento para as reais demandas da população, além de enfatizar a participação de segmentos universitários nas lutas sociais e na transformação da sociedade. Esse vigor estudantil e sua ligação com as lutas sociais e o movimento operário reaparece nas revoltas estudantis francesas de 1968.

Apesar de, essencialmente, a extensão universitária vir como um elemento de democratização da universidade sabemos que não é bem assim que acontece. A extensão universitária, dentro do tripé ensino-pesquisa-extensão, é sempre menosprezada e, quando praticada, costuma servir como um instrumento de manutenção das relações de dominação vigentes, com características mercadológicas e/ou assistencialistas.

Assim, devemos entender que a extensão universitária é um conceito em disputa. A extensão univesitária “acadêmica” se resume a reproduzir técnicas e o conhecimento formal aprendido na universidade, muitas vezes nem mesmo atingindo a população que não tem acesso à universidade. Existe ainda a extensão universitária mercantilista, cujo objetivo é prestar serviços aos interesses empresariais. A extensão universitária assistencialista, por sua vez, se restringe à amenização das necessidades imediatas e emergenciais, criando vínculos de dependência e sem nenhuma proposta de transformação social. Este modelo de extensão, apesar de se revestir de certa neutralidade, contribui para a reprodução da lógica do capital, uma vez que serve para o apaziguamento das tensões sociais.

Nós, estudantes, devemos ter um olhar crítico a esses modelos de extensão hegemônicos nas nossas universidades, e guiarmos nossas lutas por um modelo de extensão que tenha grande potencial transformador, ou seja, a luta pela Extensão Popular. Esta busca expor as contradições da sociedade capitalista, atuando junto aos movimentos sociais, objetivando contribuir com o processo de tomada de consciência dos trabalhadores, e, assim, contribuir para a emancipação, empoderamento e autonomia da classe organizada.

A disputa pela extensão universitária popular é imprescindível na luta por uma maior democratização da universidade. Sabemos, porém, que dentro da nossa sociedade essa é uma luta de resistência contra a crescente precarização, elitização e privatização das universidades e que só teremos uma universidade realmente democrática quando superarmos esse sistema que constrói os muros universitários.

Yvana Hafizza Snege de Carvalho
Coordenação de Extensão Universitária 2015

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