Conjuntura Estudantes em luta pelo SUS e para além do SUS Políticas de Saúde

Financiamento em Saúde: De Onde Viemos e Para Onde Vamos? No ratings yet.

A falta de destinação de recursos adequados para o SUS foi, desde sua criação, um grande entrave para a sua consolidação na forma em que fora idealizado. Ao longo de toda a década de 90 o novo sistema sofreu com uma intensa instabilidade de receitas: por alguns anos sendo financiado por recursos vindos de impostos da seguridade social que sofriam variação na porcentagem destinada à saúde pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, e ora sim, ora não tendo a contribuição de outros impostos como a CPMF. Nos anos 2000, mesmo após a aprovação da Emenda Constitucional 29 que estipulou percentuais mínimos de investimento em saúde por parte da União, dos estados e dos municípios, tivemos ao longo dos anos o desvio recorrente das receitas da seguridade social e da saúde para o pagamento da dívida pública por meio da Desvinculação de Receitas da União (DRU).

Outro grande impasse que se colocou desde a criação do SUS foi a permissão pela Constituição de 1988 de atividade da iniciativa privada a partir da suplementaridade ou da complementaridade entre os sistemas, fazendo com que o seu pleno desenvolvimento de forma 100% pública e estatal fosse sempre visto como uma grande ameaça aos lucros das grandes empresas de serviços e planos de saúde. É exatamente por isso que ao longo dos últimos 30 anos o que temos acompanhado é um verdadeiro parasitismo das empresas privadas por dentro do Estado sob os chamados “novos modelos de gestão”, que nada mais são do que o neoliberalismo lançando mão de novas formas de mercantilização, terceirização e privatização dos serviços. A criação das Organizações Sociais (OS), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), o crescente incentivo fiscal às Instituições Filantrópicas e os perdões bilionários de dívidas das empresas de planos de saúde são exemplos claros de como desde a década de 90 e ao longo dos anos 2000 o projeto neoliberal não parou, em nenhum momento, de avançar e desfinanciar o SUS.

Para piorar, nos últimos anos, mais do que o seu desfinanciamento, o que temos acompanhado é o seu verdadeiro desmonte. No governo Temer, só para citar alguns dos retrocessos, a aprovação da Emenda Constitucional de Teto dos Gastos congelou os investimentos públicos nas áreas sociais pelos próximos 20 anos, a contrarreforma trabalhista precarizou e flexibilizou ainda mais as formas de contratação, e a nova Política Nacional de Atenção Básica reverteu o financiamento prioritário em Unidades da Saúde da Família e retirou a obrigatoriedade de contratação nas equipes de saúde dos Agentes Comunitários. Nos primeiros 200 dias do governo Bolsonaro, por sua vez, temos acompanhado os inúmeros retrocessos anunciados em áreas que impactam diretamente a saúde, além da destruição do sistema público de previdência social com a proposta da “Nova Previdência”, mostrando como a saúde pública e o SUS se encontram sob grave ameaça.

Diante desse calamitoso cenário, qual seria o nosso papel enquanto estudantes e futuros trabalhadores da área da saúde? Mais do que fazer frente a todo esse retrocesso nas nossas lutas do movimento estudantil, precisamos também começar a pensar e a construir uma alternativa real de saúde coletiva popular. Precisamos sim defender o SUS e todas as ameaças que se lançam sobre ele, mas é preciso também ir além e propor um projeto político que construa um sistema de saúde completamente livre da iniciativa privada; com destinação de investimento público e estatal para áreas que contribuam para a nossa soberania nacional; com o fortalecimento e investimento em pesquisas na área da saúde socialmente referenciadas; com investimento público 100% estatal suficiente e adequado nos três níveis de atenção; e, principalmente, um Estado que seja mais comprometido com a saúde da população do que com a fortuna e taxa de lucro de banqueiros e empresários de planos de saúde.

Por isso, é ainda mais importante que nesse momento consigamos analisar de forma qualitativa o que todo esse período de existência do SUS significou. Se a história nos prova como a sua consolidação nunca foi verdadeiramente possível sob tantos ataques do mercado e do capital, não deve ser utopia ou mero devaneio nos perguntar: é possível a saúde ser um direito em um sistema que mercantiliza a vida?

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