Pandemia COVID-19

A Situação das Graduações em Medicina Diante de Uma Pandemia No ratings yet.

À luz das atuais evidências epidemiológicas sobre contágio e recomendações dos órgãos internacionais de saúde para evitar a transmissão do novo coronavírus – que alcançou status de pandemia – diversas instituições de ensino superior (IES) cancelaram a maior parte de suas atividades para evitar aglomerações, incluindo aulas da graduação e da pós, reuniões administrativas, atividades de pesquisa e de extensão. Para os cursos de graduação e pós-graduação na área da saúde, entretanto, suscitou dúvida sobre o que fazer nesse contexto com os estudantes inseridos por meio do ensino em serviço nos locais de assistência à saúde – ainda mais quando convivemos com panoramas de formação tão diferentes nas IES espalhadas por nosso país.

  • INTERNATO MÉDICO

Nesse sentido, algumas instituições resolveram manter as atividades regulares do internato médico, outras optaram por suspender parcialmente ou completamente, de acordo com a realidade dos cenários em que atuam. Nos locais com plano de contingência em ação, com cancelamento de consultas ambulatoriais, internações e cirurgias eletivas, e reordenamento da mão de obra no serviço, muitos estágios foram prejudicados, não fazendo sentido expor ao risco desnecessariamente os estudantes, potenciais vetores assintomáticos. Por outro lado, surge o plano do Ministério da Saúde de Mandetta de utilizar a mão-de-obra desses para atuar na linha de frente do manejo à epidemia, com regulamentação por meio da portaria lançada pelo Ministério da Educação em 20/03/2020. Nesta, autoriza-se, em caráter excepcional devido à situação de emergência de saúde pública, a alocação dos estudantes do internato médico para trabalharem nas áreas de pediatria, clínica médica e saúde coletiva em Unidades Básicas de Saúde (UBSs), Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e Unidades Hospitalares (UHs), com supervisão pelos médicos do serviço e contabilização de carga horária pelas IES em substituição de estágios curriculares obrigatórios nas áreas contempladas pela Portaria.

É incoerente e negligente cobrar responsabilidade social dos estudantes que não têm todas as competências necessárias para o exercício profissional, inserindo-os em serviços de saúde que não contemplam estrutura adequada de capacitação e de supervisão – pela falta de profissionais habilitados para a preceptoria, pelo número insuficiente de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), e pela situação exigir uma dinâmica de atendimento pouco compatível com a do ensinoserviço – organizada ainda mais às pressas no contexto da pandemia. A fim de não deformar o seu aprendizado, o graduando deve ser resguardado de toda a segurança necessária para a sua prática letiva. Além disso, todos os estudantes devem ser tratados de forma simétrica, não desprivilegiando os que possuem obstáculos ao acesso aos campi e hospitais universitários, seja por motivos de saúde ou por qualquer condicionante social agravado pela crise econômico-sanitária que estamos vivenciando.

  • EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA

Ademais, tendo em vista o compromisso irrevogável com a educação médica de qualidade, a DENEM coloca-se contrária à substituição de atividades presenciais por modalidades de “Ensino à Distância” (EAD) no curso de Medicina – mesmo em regime de exceção e mesmo restrito a competências teórico-cognitivas para o 1º ao 4º anos. Para além de não considerar a desigualdade do acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) pelos estudantes, que coloca os estudantes em patamares distintos na obtenção de ensino e expõe ao risco aqueles que precisam buscar acesso fora de suas residências, o ensino em saúde possui características inerentes incompatíveis com essa modalidade de ensino, pois esta possui diversas limitações pedagógicas que precarizam a formação. Isso não significa se opor ao envio de materiais de apoio, leituras e planos de estudo para os estudantes nesse período, mas sim que esses não devem ser considerados como substitutos ao calendário acadêmico, o qual deverá ser reposto de forma a ser decidida, após o fim da pandemia, nas instâncias deliberativas máximas das instituições, de forma a causar o menor prejuízo

 

  • ESCOLAS PAGAS

Considerando a Lei 9870/99, que dispõe sobre o valor total das anuidades escolares e dá outras providências, as mensalidades são resultados do parcelamento da semestralidade, anuidade ou créditos das matérias. Por isso, juridicamente podem continuar a ser cobradas uma vez que são divisões de um contrato. Nesse contexto, é ainda mais absurdo adotar a modalidade à distância como substituta à presencial, mantendo a cobrança das altas mensalidades, para obter um ensino precarizado e pagar pela manutenção de uma infraestrutura que não estão utilizando. Nesse sentido, a DENEM defende estratégias de modificação das cobranças das mensalidades até a situação se normalizar e o calendário ser adequado à modalidade presencial.

Dentre as estratégias, orientamos que, uma vez que a modalidade EaD foi aceita pela instituição, os Centros e Diretórios Acadêmicos exijam representatividade estudantil nas comissões que debatam a implementação da modalidade e coletem as opiniões dos discentes para levá-las às diretorias. Consideramos fundamental, também, pressionar para que não sejam aplicados juros no atraso da mensalidade, tendo em vista que muitos fiadores são autônomos e estão com renda abaixo do normal durante esse período.

Além disso, reivindicamos a diminuição de mensalidades para que equiparem o valor dos cursos presenciais aos cursos em EAD, com os descontos proporcionais à diminuição das despesas. Segundo o Art 20°, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que lhes diminuam o valor, ou seja, as faculdades de medicina, enquanto fornecedoras de um serviço educacional, devem responder pela redução do valor de seus serviços, ao alterar a modalidade presencial para EaD, que é inferior e não acarreta gastos na manutenção da infraestrutura, água ou energia, que estão inclusos nos valores das mensalidades. Os consumidores (discentes), segundo o mesmo artigo, podem exigir alternativamente a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível; a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; o abatimento proporcional do preço. Portanto, os estudantes podem exigir tanto a reposição de suas aulas quando cabível, quanto o abatimento proporcional do preço, pois a modalidade EaD é menos custosa que a modalidade presencial às instituições.

Ainda, segundo o CDC, em seu artigo 39° resolve que é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, ou seja, cobrar o valor da modalidade presencial para oferecer EaD.

Para além disso, em consonância com a União Nacional dos Estudantes, em sua nota “Em defesa da redução das mensalidades de cursos presenciais na quarentena”,  propomos também que as instituições de ensino que flexibilizarem seus cursos presenciais para EAD, garantam o trancamento do semestre sem taxação, dado que o estudante não poderá cursá-lo por motivo de força maior.

Por fim, reforçamos nosso posicionamento em defesa de universidades 100% gratuitas de qualidade e contrário a tendência de mercantilização da educação médica, acreditando que a educação não deve ser tratada como mercadoria. No entanto, nesse estado de exceção em que estamos vivendo, estamos trabalhando em conjunto com nossa assessoria jurídica para orientar da melhor forma possível todos os estudantes de escolas médicas pagas, visando evitar abusos e prejuízos, tanto financeiros quanto educacionais, que possam atingir os estudantes.

  • ANTECIPAÇÃO DE FORMATURAS

Quanto à antecipação da formatura, que até então só foi realidade de IES pagas mas já mencionada por Mandetta em conferência com prefeitos no dia 22/03/20, acreditamos que a perda dos estágios desses períodos para adentrar programas de assistência, como o Mais Médicos, configura formação deficitária visto que desrespeita as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs), representa prejuízo para o estudante – inclusive econômico aos de escolas privadas, já que as mensalidades serão cobradas igualmente pelo período de 12 meses do ano letivo – e não significa benefício pela assistência que proverá.

Entretanto, entende-se, por caráter de exceção frente à pandemia, aqueles estudantes do 12º período que já cumpriram as 7200h mínimas exigidas pelo Ministério da Educação e desejam atuar, requererem o adiantamento da colação de grau. Reitera-se, no entanto, que a colação de grau antecipada tem impacto ínfimo no controle da pandemia, considerando que ainda não há déficit de profissionais na linha de frente – há cerca de quase 6 mil médicos a serem contratados, segundo Ministério da Saúde; e 24 mil médicos são formados anualmente, segundo Conselho Federal de Medicina. Verdadeiramente necessária e urgente, nesse cenário, é a luta pelo correto financiamento do SUS, que não ocorre desde sua implementação, sendo atualmente desfinanciado, e, por isso, demandando urgência pela revogação imediata da Emenda Constitucional 95, que só em 2019 retirou R$ 20 bilhões do orçamento nacional da Saúde e, se mantida, será responsável pelo colapso do Sistema de Saúde e pela morte de milhares de brasileiros.

 

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