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Carta Aberta ao Ministério da Saúde – Pela Revogação da Portaria nº 492 No ratings yet.

CARTA AO MINISTÉRIO DA SAÚDE, A VOSSA EXCELÊNCIA O SR. DR.

LUIZ HENRIQUE MANDETTA

 

Por meio desta carta, solicita-se a revogação da Portaria nº 492, publicada em 23 de março de 2020 para correção em tempo hábil, isto é, antes do início do Estágio dos estudantes de medicina, enfermagem, farmácia e fisioterapia, pelos pontos e justificativas que seguem:

 

1) SUPERVISÃO ADEQUADA DOS ESTUDANTES

Na portaria Nº 492 de 23 de março de 2020, é explicitado que os estudantes serão supervisionados, entretanto, não explicita quem especificamente realizará a supervisão e se eles terão formação adequada para isto. A supervisão dos estágios obrigatórios deve ser realizada por profissionais capacitados para isso, os preceptores ou tutores. Além disso, ao oferecer bonificação para provas de residência, compreendemos que esta publicação visa atrair como supervisores os profissionais formados, com registro no respectivo conselho e que ainda não se especializaram, ou seja, os recém- formados. Como se isto não fosse grave o bastante, esta portaria não garante que os mais de 1900 programas de residência – além dos ofertados pelo SUS – também aplicarão essa bonificação. Tendo em vista o que já foi apresentado, afirmamos ser incoerente e negligente cobrar como a responsabilidade social dos discentes que não  têm todas as competências necessárias para o exercício profissional, inserindo-os em serviços de saúde que não contemplam estrutura adequada de supervisão, uma vez conhecida a falta de profissionais habilitados para a preceptoria. Também consideramos que é necessária a regulamentação e divulgação clara e pública pelo Ministério da  Saúde da relação de supervisores habilitados, a fim de evitar que os alunos sejam alocados pelas Secretarias de Saúde em serviços que não possuam profissionais capacitados à preceptoria pelas Universidades. Caso contrário, os estudantes não conseguirão atuar de forma efetiva no combate à COVID-19, podendo, inclusive, tornarse vetores assintomáticos da doença, pois não possuem capacidade técnica suficientes para tomar decisões clínicas sem o adequado suporte.

 

2) DISPONIBILIDADE DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL

Ressaltamos que, apesar de reconhecer como requisito à atividade de Estágio o uso  de Equipamentos de Proteção  Individual (EPIs),  a Portaria  desconsidera   que,  no atual contexto, a realidade nacional é de um número insuficiente de EPIs. Confirma-se o exposto pelo grande número de hospitais e profissionais que vêm fazendo campanhas de arrecadação de EPIs contando com o apoio financeiro popular, pois nenhuma medida efetiva do Governo disponibilizou esses equipamentos em quantidade e qualidade adequadas, seguindo as últimas recomendações da comunidade científica mundial. Portanto, é mandatória a garantia da disponibilidade e fiscalização do uso de EPIs e a possibilidade de dispensa dos estudantes do serviço caso os equipamentos não estejam disponíveis, a fim de que o Estágio seja realizado levando em conta a segurança dos alunos.

 

3) SUBSTITUIÇÃO DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO

Considerando a realidade socioeconômica historicamente desigual do nosso país, agravada  pelas  medidas  que  restringem  o  transporte  público,  é  preciso  levar  em consideração que a dificuldade de mobilidade urbana pode se tornar um impeditivo para estudantes que se encontram impossibilitados de se dirigir aos serviços. Além disso, sabidamente há estudantes em grupos de risco por condições patológicas (como doenças respiratórias e/ou de imunossupressão) que não poderiam atuar no combate à pandemia na linha de frente, pois isso configuraria irresponsabilidade submetê-los a tamanho risco. Há que se considerar também os estudantes que convivem com familiares com imunossupressão ou idosos, sendo que os discentes atuantes, neste caso, estariam oferecendo um potencial risco a terceiros.

 

4) BONIFICAÇÃO NO PROCESSO SELETIVO DE PROGRAMAS DE RESIDÊNCIA

A medida de bonificação fere a isonomia dos candidatos aos processos seletivos dos Programas de Residência. Além dos pontos levantados sobre dificuldades socioeconômicas e condições de saúde, precisamos levar em consideração os diversos profissionais já formados que estão trabalhando com dedicação na linha de frente dessa pandemia, e que não seriam igualmente contemplados por essa bonificação. Ressalta-se ainda que esta medida é inédita aos estudantes. Considerando que nunca antes foi ofertada bonificação nos processos seletivos de residência para estudantes, não é possível afirmar qual será a utilidade real desta bonificação, nem como se dará nas mais diversas instituições que possuem vagas de Residência Médica e Multiprofissional, ou como irá se adequar ao processo pedagógico da seleção. Diante do exposto, solicitamos a suspensão completa deste item.

 

5) VOLUNTARIADO 

Compreendemos a situação de extrema crise na saúde pública enfrentada pelo nosso país, e por isso, consideramos válida a participação voluntária dos estudantes que puderem e desejarem atuar no enfrentamento da crise, dentro das suas capacidades, desde que com garantia máxima e regulamentada de adequada supervisão e segurança. Entretanto, reiteramos que não é esta medida isolada que dará conta do combate à pandemia, sendo de extrema urgência a disponibilização de maiores  recursos financeiros e pessoais profissionais ao Sistema Único de Saúde e à população, tendo em vista a Emenda Constitucional 95/2016, que comprometeu bruscamente o orçamento da Saúde Pública e que no contexto de Pandemia pela COVID-19 dificultará ainda mais o combate à doença.

Em tempo, solicita-se que, em situação de escrita de Portarias que versem sobre a Saúde e Educação dos estudantes e profissionais, sejam consultadas as entidades de Regulamentação e de Representação, tanto profissionais quanto estudantis.

25 de março de 2020.

Veja aqui a carta na íntegra com as entidades que a assinaram.

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